Rastreamento generalizado e anúncios inapropriados encontrados em sites para crianças

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À primeira vista, os sites construídos para crianças parecem inofensivos, pois a maioria deles oferece jogos inocentes, ferramentas de aprendizado, cores vibrantes, mascotes de desenhos animados e aplicativos amigáveis para crianças. Mas por trás dessa interface fofa, uma imagem diferente emerge: a de vigilância, exploração e negligência regulatória. Uma investigação recente em mais de 2.000 sites para crianças mostra uma tendência perturbadora: quase todos eles se envolvem em rastreamento oculto, enquanto um número significativo exibe anúncios direcionados ao comportamento, alguns dos quais promovem conteúdo que vai desde soluções rápidas de saúde mental até serviços sugestivos sexualmente.

A pesquisa, liderada por uma equipe de especialistas em privacidade e cibersegurança, não se baseou em listas de terceiros ou suposições. Em vez disso, a equipe construiu um classificador personalizado para detectar sites que realmente visam crianças com base em metadados extraídos de mais de dois milhões de páginas. Uma vez que o catálogo foi construído, esses sites foram rastreados usando ferramentas avançadas em cinco regiões globais e em múltiplos dispositivos. O resultado é uma das auditorias mais abrangentes dos espaços online voltados para crianças até o momento – e o que foi encontrado levanta questões urgentes.

Aproximadamente 90% dos sites analisados foram encontrados para incorporar rastreadores de terceiros – scripts e cookies que registram silenciosamente o comportamento do usuário, dados do dispositivo e hábitos de navegação. Cerca de 27% dos sites exibiam anúncios personalizados usando dados comportamentais, uma prática que – por lei em várias jurisdições – deve exigir o consentimento parental explícito. No entanto, nenhum mecanismo desse tipo estava em vigor.

Ainda mais alarmantes foram os tipos de anúncios descobertos. Usando aprendizado de máquina e visão computacional, a equipe escaneou dezenas de milhares de imagens e links de anúncios. Entre eles estavam promoções de serviços de namoro, programas de perda de peso e até mesmo fornecedores de brinquedos sexuais. Alguns anúncios usavam imagens sugestivas ou perturbadoras, incluindo figuras seminuas ou textos emocionalmente manipuladores destinados a promover cliques. Esses anúncios não estavam escondidos em cantos obscuros da internet – eles apareciam em sites que ofereciam planilhas educativas, páginas para colorir ou jogos de matemática para crianças em idade escolar.

Legalmente, esse conteúdo está em terreno perigoso. Nos Estados Unidos, a Lei de Proteção à Privacidade Online das Crianças (COPPA) proíbe a coleta de dados de usuários menores de 13 anos sem permissão de pais verificada. Na União Europeia, o GDPR e o próximo Digital Services Act vão ainda mais longe – proibindo o direcionamento comportamental a menores. No entanto, a aplicação é inconsistente e, como mostra este estudo, muitos sites voltados para crianças ignoram as regras ou trabalham com redes de publicidade que as ignoram.

O rastreador construído para esta investigação não apenas registrou o que as crianças poderiam ver – ele simulou a interação com banners de consentimento, capturou gravações visuais e extraiu divulgações de anúncios para determinar quais anúncios eram explicitamente marcados como personalizados. Mais de 70% daqueles com páginas de divulgação admitiram usar direcionamento comportamental.

Uma descoberta particularmente sombria: mesmo quando os sites afirmam estar em conformidade com a COPPA, muitos incorporam scripts de rastreamento antes que um usuário interaja com a página. Em essência, eles violam leis de privacidade a partir do momento em que uma criança acessa o site. Pior ainda, os rastreadores muitas vezes remetem a grandes redes de publicidade e corretores de dados conhecidos por montarem perfis detalhados de usuários – perfis que, neste caso, podem pertencer a crianças que não podem consentir legalmente.

As implicações dessa pesquisa são amplas. Ela demonstra não apenas uma vulnerabilidade técnica na web infantil, mas uma falha de política. Apesar das leis existentes, a aplicação continua frouxa e os anunciantes continuam alcançando um público jovem com material considerado prejudicial pelos próprios padrões da indústria. Até que os reguladores apliquem uma supervisão significativa – e os desenvolvedores de plataformas infantis assumam uma responsabilidade real – esses sites permanecerão um ponto fraco na paisagem de privacidade digital, abertos à exploração.